As mudanças climáticas e a impermeabilização crescente das cidades brasileiras transformaram a drenagem urbana em um dos maiores desafios do saneamento básico. As redes convencionais de galerias já não dão conta de reter os picos de vazão em dias de chuvas intensas, e as enchentes se tornaram rotina em diversos centros urbanos.
Mas algumas capitais brasileiras vêm se destacando ao adotar Soluções Baseadas na Natureza (SbN) e sistemas de Drenagem Urbana Sustentável (DUS). São alternativas que controlam a água da chuva na origem, reduzem alagamentos, melhoram a qualidade da água e ainda ajudam a criar cidades mais resilientes e ambientalmente equilibradas.
Curitiba (PR): jardins de chuva e valas de infiltração
Curitiba, referência em planejamento urbano, foi pioneira ao incluir no seu Plano Diretor de Drenagem a exigência de jardins de chuva e valas de infiltração em projetos públicos e privados. Esses dispositivos são projetados para reter a água de chuva em pequenas depressões no solo, onde a vegetação e camadas drenantes ajudam a infiltrar lentamente a água, reduzindo o impacto imediato sobre galerias e rios.
Para os engenheiros que atuam na capital, a principal vantagem é o baixo custo de implantação e manutenção, além da eficiência hidráulica comprovada em áreas densamente ocupadas. Hoje, Curitiba trata a drenagem não como obra isolada, mas como parte do desenho urbano.
São Paulo (SP): piscinões aliados à drenagem verde
A maior cidade do Brasil tem uma longa história com os piscinões, grandes reservatórios de detenção que armazenam a água da chuva e liberam de forma controlada para córregos e rios. Nos últimos anos, porém, a prefeitura passou a combinar essa infraestrutura com medidas de drenagem verde, como telhados verdes em edifícios públicos e pavimentos permeáveis em parques lineares.
O resultado é uma estratégia híbrida: enquanto os piscinões atuam na macroescala, reduzindo enchentes históricas em áreas críticas como o Aricanduva, as soluções verdes ajudam a reter a água na origem, além de melhorar o microclima e reduzir ilhas de calor.
Porto Alegre (RS): wetlands construídos
Na capital gaúcha, o destaque são os wetlands construídos, áreas alagadas artificiais projetadas para reter e tratar naturalmente a água da chuva. Esses sistemas funcionam como filtros vivos, reduzindo sólidos e poluentes do escoamento urbano antes que a água chegue a rios e lagos.
Além da eficiência hidráulica, Porto Alegre conseguiu integrar a drenagem à preservação ambiental, já que esses wetlands se tornaram habitat para diversas espécies de fauna e flora, agregando valor ecológico à cidade.
Recife (PE): pavimentos permeáveis e legislação obrigatória
Recife, que enfrenta altos índices de chuvas e alagamentos frequentes, adotou um Plano Diretor de Drenagem Sustentável com medidas descentralizadas. A cidade implantou pavimentos permeáveis em áreas públicas e passou a exigir legalmente que novos empreendimentos incorporem dispositivos de retenção de águas pluviais, como cisternas e reservatórios.
Essa abordagem faz com que parte da responsabilidade da drenagem seja compartilhada com o setor privado, criando um sistema mais justo e eficiente. O resultado é a redução significativa da sobrecarga das galerias e maior resiliência em bairros críticos.
Goiânia (GO): bacias de detenção multifuncionais
Goiânia apostou em bacias de detenção integradas a parques urbanos. Durante períodos de seca, funcionam como áreas de lazer; em épocas de chuvas fortes, atuam como reservatórios temporários que controlam o escoamento para os córregos da cidade.
Essa solução multifuncional alia engenharia hidráulica à qualidade de vida urbana, transformando espaços de risco em locais de convivência e valorização ambiental.
O que essas experiências ensinam
Os casos de sucesso mostram que a drenagem sustentável é viável e replicável em diferentes contextos brasileiros. Algumas lições se repetem:
- Planejamento integrado: drenagem deve ser pensada junto com mobilidade, habitação e áreas verdes.
- Infraestrutura híbrida: obras tradicionais ainda são necessárias, mas precisam ser combinadas com soluções verdes.
- Políticas públicas e normas: legislações municipais, como em Recife e Curitiba, são decisivas para que essas soluções se tornem regra e não exceção.
- Engajamento social: a manutenção e o cuidado compartilhado com a população aumentam a durabilidade e a eficiência das soluções.
Conclusão
Curitiba, São Paulo, Porto Alegre, Recife e Goiânia provaram que é possível transformar a drenagem urbana em solução de resiliência climática e melhoria da qualidade de vida. Mais do que obras de engenharia, esses exemplos mostram que drenagem sustentável é um novo paradigma de cidade: onde a água deixa de ser vista como ameaça e passa a ser tratada como recurso.



