Saneamento não é prioridade no Brasil em 2025

Apesar do consenso técnico sobre sua relevância econômica e social, o saneamento continua atrás de outros eixos de infraestrutura em 2025. A análise dos números indica que, embora haja crescimento e janela de oportunidades, a alocação orçamentária direta é tímida e a dependência do capital privado segue elevada. Portanto, para profissionais do setor, torna-se decisivo interpretar o comparativo setorial, compreender a composição público–privada e ajustar portfólios com foco em resultados verificáveis. Assim, com planejamento e governança, o saneamento avança de promessa a entrega concreta.

O que mostram os dados de 2025

As projeções indicam investimentos totais em infraestrutura próximos de 2,21% do PIB, com cerca de 72% de origem privada. Setorialmente, a carteira é liderada por energia elétrica e transportes; já o saneamento soma aproximadamente R$ 46,0 bilhões, dos quais R$ 31,2 bilhões são privados e R$ 14,8 bilhões são públicos (com forte peso de estados e municípios). Assim, o saneamento cresce, mas ainda não lidera o fluxo de capital. Além disso, observa-se que energia permanece majoritariamente financiada pelo privado, enquanto transportes retém parcela relevante de investimento público, principalmente em rodovias e mobilidade.

Por que o saneamento fica atrás

Em primeiro lugar, a competição orçamentária é intensa. Energia elétrica concentra projetos escaláveis, com marcos regulatórios maduros e governança testada, atraindo capital abundante. Em paralelo, transportes absorvem programas com alta visibilidade política e cronogramas já conhecidos. Assim, o saneamento, por sua natureza capilar e difusa, disputa espaço com agendas de retorno percebido como mais direto. Em segundo lugar, a modelagem de contratos de saneamento exige desenho fino de risco, dados operacionais consistentes e previsibilidade regulatória. Sem isso, o custo de capital sobe, a competição cai e a execução atrasa. Por fim, a maturidade de pipeline ainda é heterogênea entre estados e municípios, o que reduz a velocidade de contratações e desembolsos.

O papel do orçamento público

O piso de investimento federal para 2025, embora superior ao mínimo exigido, precisa cobrir múltiplas políticas e obras. Consequentemente, a fatia diretamente disponível para saneamento é limitada. Na prática, estados e municípios assumem protagonismo no componente público do setor, justamente onde a capacidade de execução, o cadastro técnico e a governança variam muito. Portanto, sem padronização de critérios, carteiras e instrumentos de garantia, o esforço se dilui. Além disso, a competição com outras áreas pressionadas por demandas urgentes reforça a necessidade de justificativas técnicas robustas para priorizar o saneamento no ciclo orçamentário.

O que o comparativo setorial ensina

O comparativo entre setores deixa claro que o saneamento precisa disputar orçamento com argumentos de produtividade, saúde pública e adaptação climática. Por um lado, energia e transportes apresentam mecanismos já amadurecidos para catalisar o investimento privado e alinhar metas de entrega. Por outro lado, o saneamento ainda carrega passivos históricos e benefícios muitas vezes menos visíveis no curto prazo. Assim, para ganhar prioridade, é indispensável demonstrar, com números, que cada real investido em saneamento retorna múltiplos em redução de custos com saúde, valorização imobiliária, atração de investimentos, geração de empregos e resiliência hídrica.

Dependência do privado: oportunidade e risco

A elevada participação privada no saneamento é, simultaneamente, vetor de expansão e fonte de vulnerabilidades. É oportunidade porque viabiliza capex onde o caixa público é insuficiente; e é risco porque amplia a sensibilidade a falhas contratuais e regulatórias. Portanto, para destravar projetos bancáveis com tarifas justas, é crucial calibrar a alocação de riscos, assegurar regras de reequilíbrio econômico-financeiro, reduzir incertezas de licenciamento e padronizar indicadores de desempenho. Desse modo, o custo de capital tende a cair, a competição aumenta e as obras andam. Caso contrário, o setor permanece dependente de garantias onerosas e de ciclos políticos, o que posterga a universalização do saneamento.

Implicações para companhias e engenheiros

Com a carteira de 2025 estruturada dessa forma, companhias e projetistas de saneamento precisam agir em três frentes. Primeiro, qualificar projetos para financiamento: estudos robustos, uso de BIM, memorial descritivo padronizado, cronogramas realistas e métricas “pagas por desempenho”. Segundo, fortalecer a governança: PMOs setoriais, cadastros técnicos confiáveis, supervisão independente e auditoria de indicadores. Terceiro, acelerar a digitalização: telemetria, redução de perdas, automação de estações, interpretação de dados e integração com regulação responsiva. Além disso, o alinhamento do saneamento com agendas de saúde, habitação, drenagem urbana e clima amplia fontes de recurso e melhora a taxa social de retorno dos investimentos.

Recomendações objetivas para subir de patamar

  • Planejar por carteiras, não por obras isoladas: agrupar projetos de água, esgoto e reuso por bacias e clusters, capturando escala e padronização.
  • Modelagem contratual madura: cláusulas de desempenho, metas anuais verificáveis e gatilhos de expansão atrelados a indicadores de acesso e qualidade.
  • Garantias e funding: fundos garantidores, debêntures incentivadas, blended finance e seguro-performance calibrado ao risco real do saneamento.
  • Regulação previsível: revisão tarifária transparente, regras claras de reequilíbrio e estímulos a inovação e eficiência operacional.
  • Métricas de impacto: controle de perdas, novas ligações de esgoto, conformidade de efluentes e metas de reuso comunicadas à sociedade.
  • Industrialização de soluções: bibliotecas BIM, estações compactas, padronização de equipamentos, logística de obras enxuta e comissionamento célere.
  • Integração com clima e saúde: priorização de projetos que elevem a segurança hídrica e reduzam internações, evidenciando o valor social do saneamento.

Limitações e leitura crítica

As projeções refletem cenário base e podem variar conforme licitações, cronogramas físico-financeiros e dinâmica macroeconômica. Ainda assim, a convergência entre dados de investimento total, participação privada e composição setorial fortalece a conclusão central: o saneamento avança, porém não lidera a infraestrutura brasileira em 2025. Desse modo, enquanto energia e transportes preservam protagonismo, o saneamento permanece condicionado à boa modelagem, à execução eficiente e à disputa por espaço no orçamento público.

Conclusão

O diagnóstico é direto: saneamento não é prioridade dos nossos governantes. Embora exista evolução e um pipeline relevante, a soma de baixo aporte público direto, alta dependência do privado e competição acirrada por recursos mantém o setor em posição secundária. Portanto, se a meta é universalização com qualidade, é essencial migrar do discurso à alocação efetiva: mais orçamento estável, melhores contratos e métricas transparentes. Assim, o saneamento se consolida como política de Estado, e não como projeto episódico, entregando saúde, produtividade e resiliência para a população.

Fontes