Aplicação de fibra óptica distribuída para identificar vazamentos em tempo real nas redes de água

No setor de saneamento, um dos maiores desafios enfrentados pelas companhias de abastecimento é a detecção precoce de vazamentos em rede de água. Perdas físicas representam não apenas prejuízo financeiro, mas também desperdício de um recurso cada vez mais escasso. É nesse cenário que surge a aplicação de fibra óptica distribuída, uma tecnologia inovadora capaz de identificar vazamentos em tempo real e revolucionar a forma como as operadoras monitoram suas redes.

O que é a fibra óptica distribuída?

Diferente da fibra óptica tradicional usada apenas para transmissão de dados, a fibra óptica distribuída (Distributed Acoustic Sensing – DAS) transforma todo o cabo em um sensor contínuo de vibração, temperatura e pressão.

Isso significa que qualquer alteração no padrão hidráulico — como a movimentação da água escapando por um vazamento — gera uma “assinatura acústica” que é detectada imediatamente. O sistema analisa esses sinais e localiza o ponto exato da ocorrência, em tempo real.

Como implementar a tecnologia nas redes de água

A implementação é mais simples do que parece e pode ser feita em três etapas principais:

  1. Instalação da fibra óptica ao longo das adutoras e redes principais
    • Pode-se aproveitar cabos já existentes de telecom ou instalar novos cabos dedicados.
    • A fibra é posicionada junto às tubulações de maior criticidade, como adutoras e redes em áreas de difícil acesso.
  2. Integração com unidades de monitoramento
    • Um equipamento chamado interrogador óptico transforma a fibra em um “tapete sensorial”.
    • O interrogador processa os sinais acústicos e converte em informações digitais de vazamento, rompimento ou até tentativas de fraude.
  3. Central de controle e analytics
    • Os dados coletados são enviados para uma central de monitoramento integrada ao sistema de gestão da companhia.
    • Plataformas de análise preditiva podem cruzar informações de pressão, consumo e histórico de manutenção para priorizar ações em campo.

Benefícios para as companhias de saneamento

  • Redução drástica das perdas reais: os vazamentos são identificados na hora, evitando que fiquem meses desperdiçando água.
  • Eficiência operacional: equipes de campo são direcionadas de forma precisa, diminuindo custos de deslocamento e retrabalhos.
  • Aumento da vida útil da rede: a detecção precoce previne colapsos maiores, como rompimentos de adutoras.
  • Segurança patrimonial: além da água, a fibra também pode detectar vibrações externas, como tentativas de ligação clandestina.

Casos de sucesso

Algumas experiências pioneiras já mostram o potencial da tecnologia:

1) Severn Trent Water (Reino Unido) – projeto “Dark Fibre”

Piloto usando fibras “escuras” existentes ao longo das adutoras. Fase 1 monitorou ~40 km e demonstrou detecção direta de vazamentos a ±0,5 m da fibra e detecção indireta por saturação de solo até 5 m; pelo resultado, o regulador Ofwat financiou a expansão para 200 km (Dark Fibre 2).

2) FARYS (Bélgica) – monitoramento contínuo com DFOS (DALI)

A utility usa DFOS para localizar pequenos vazamentos numa rede de ~660 km que atende >1 milhão de pessoas, priorizando trechos críticos (ex.: 6 km em Bruxelas com risco elevado). Benefício reportado: localização contínua e proativa de microvazamentos antes de virarem rompimentos.

3) Water Corporation (Austrália) + Terra15 – monitoramento no CBD de Perth

A solução aproveitou fibras urbanas existentes para “ouvir” a rede 24/7 e reduzir risco de rompimentos (menos custos catastróficos). Em ensaios controlados, o fornecedor demonstrou thresholds: 0,75 L/min detectável a 0,1 m da fibra; 13,3 L/min a 5 m; >23,4 L/min detectados em todos os cenários testados. Na operação urbana, o objetivo documentado é “detectar antes de estourar”, economizando água e dinheiro.  

Esses pilotos já demonstram que a fibra óptica distribuída pode reduzir o tempo médio de localização de vazamentos de semanas para minutos.

O futuro da gestão inteligente das redes

A tendência é que essa tecnologia seja integrada a outras soluções digitais, como gêmeos digitais, inteligência artificial e IoT. Dessa forma, será possível criar um ecossistema de monitoramento inteligente, onde a rede “fala” em tempo real e as decisões são tomadas de forma automatizada.

No caminho da universalização do saneamento, tecnologias como a fibra óptica distribuída não são apenas diferenciais — são necessidades estratégicas para garantir eficiência, sustentabilidade e segurança no abastecimento.