CESAN e ACCIONA fecham contrato de R$ 540 milhões para ampliar saneamento no ES

Foi firmado um contrato de saneamento urbano entre a companhia estadual CESAN (Companhia Espírito Santense de Saneamento) e a empresa ACCIONA, com objetivo de prover serviços de esgotamento sanitário para oito municípios do estado do Espírito Santo, na região sudeste do Brasil.

Trata-se de uma concessão administrativa de longo prazo (23 anos), envolvendo construção, operação e manutenção das infraestruturas necessárias. O investimento previsto soma R$ 540 milhões (aproximadamente € 85 milhões).

O contrato contempla o atendimento a uma população combinada de cerca de 250 mil habitantes.

A seguir, apresenta-se uma análise técnica do projeto, apontando seus elementos estruturais, desafios, benefícios e o papel desse tipo de empreendimento em políticas públicas de saneamento.

Componentes técnicos do contrato de saneamento

Infraestrutura prevista

Para implementar os serviços de saneamento nos oito municípios, o contrato exige a construção das seguintes infraestruturas:

  • 4 Estações de Tratamento de Esgoto (ETE): responsáveis por tratar os efluentes coletados nos sistemas de esgoto urbano.
  • 65 Estações elevatórias e de bombeamento: necessárias para vencer desníveis topográficos e garantir a vazão adequada de esgoto entre os coletores e estações de tratamento.
  • 320 km de rede de coleta de esgoto: a malha de coletores domésticos que captará o esgoto e o encaminhará ao sistema de tratamento.

Além disso, o contrato prevê gestão comercial e apoio operacional ao serviço de saneamento ao longo do prazo da concessão. Esses elementos estruturais são essenciais para que o sistema de saneamento funcione com continuidade, eficiência e segurança ambiental.

Modelo de parceria público-privada (PPP)

O projeto adota o regime de concessão administrativa, um formato de PPP (parceria público-privada). Nesse modelo:

  • O poder público (via CESAN) delega à contratada (ACCIONA) a responsabilidade pela construção, operação e manutenção dos ativos de saneamento.
  • A contratada investe capital inicial e assume o risco de operação, enquanto o poder público estabelece métricas, fiscalização e metas de desempenho.
  • O contrato dura 23 anos, o que permite amortização dos investimentos e retorno financeiro sustentável.

Além disso, o projeto está alinhado com critérios de investimento sustentável, conforme a taxonomia europeia, reforçando o compromisso ambiental e de transição para uma economia de baixo carbono.

Metas de cobertura e impactos esperados

O governo do Espírito Santo tem como meta elevar o acesso a serviços de saneamento para 90% da população até 2033. Esse contrato com a ACCIONA representa um avanço importante para alcançar essa meta.

Com o novo sistema, espera-se:

  • Melhorias na saúde pública, pela redução de doenças relacionadas à falta de saneamento adequado.
  • Proteção de recursos hídricos: redução de lançamento de efluentes brutos nos corpos d’água.
  • Valorização imobiliária e desenvolvimento urbano mais sustentável nas regiões atendidas.
  • Geração de emprego e renda nos municípios envolvidos, tanto na construção como na operação das infraestruturas.

Contexto da atuação da ACCIONA no Brasil e no setor de saneamento

A ACCIONA já possui histórico extenso de atuação no Brasil, com mais de 25 anos de experiência em infraestrutura.

Alguns projetos relevantes de saneamento e água da empresa incluem:

  • Sistema de saneamento na bacia do Alcântara, em São Gonçalo (RJ).
  • Sistema de tratamento de esgoto em Santa Cruz do Capibaribe (PE).
  • Sistema de cogeração em estação de tratamento da bacia Arrudas (MG).
  • Concessão de esgoto com a Sanepar (Paraná), contemplando 48 municípios e 252 mil pessoas até 2033.

Além da área de saneamento, a ACCIONA atua em transporte, energia renovável, mobilidade urbana e infraestrutura resiliente, posicionando-se como uma empresa de soluções regenerativas e de baixo carbono.

Em 2024, a empresa apresentou receita de € 19,19 bilhões e atua em mais de 40 países no mundo. Desde 2016, mantém neutralidade de carbono em suas operações. Esse portfólio diversificado fortalece sua capacidade técnica para executar projetos de saneamento complexos e de longo prazo.

Desafios e riscos do empreendimento de saneamento

Embora robusto e promissor, o projeto enfrenta alguns desafios típicos desse tipo de concessão de saneamento:

  1. Risco operacional: as estações elevatórias e as ETEs exigem operação contínua, manutenção preventiva e corretiva rigorosa para evitar falhas, interrupções ou extravasamentos.
  2. Adequação técnica à topografia local: o sistema de coleta deve vencer desníveis e condições geográficas variadas, exigindo soluções de bombeamento adaptadas.
  3. Garantia de fluxo financeiro sustentável: receitas suficientes para cobrir custos operacionais, manutenção e retorno ao investidor dependem de arrecadação e tarifa compatível com a realidade local.
  4. Gestão comercial eficiente: identificação de clientes, cobrança e controle de inadimplência são fundamentais para viabilidade do fluxo de caixa no setor de saneamento.
  5. Fiscalização e cumprimento de metas: o poder concedente deverá acompanhar desempenho, qualidade ambiental e prazos para evitar descumprimentos contratuais.
  6. Risco regulatório e institucional: alterações legais no setor de saneamento (leis, regulamentos ou políticas públicas) podem afetar o equilíbrio contratual.

Para mitigar esses riscos, são necessárias cláusulas de reajuste, mecanismos de compartilhamento de riscos e garantias contratuais robustas.

Relevância estratégica para o setor de saneamento no Brasil

Esse tipo de contrato de saneamento representa um modelo de atração de investimento privado para ampliar cobertura em cidades médias e pequenas. Com a crescente pressão por universalização dos serviços, modelos de PPP ou concessões administrativas tornam-se imprescindíveis.

Ao viabilizar infraestrutura, operação e manutenção com padrões técnicos elevados e metas claras, projetos como esse estimulam:

  • Maior eficiência na execução de obras e operação.
  • Inovação tecnológica em tratamento e controle.
  • Atração de capitais privados para o setor.
  • Sustentabilidade ambiental e resiliência.

Nos próximos anos, será necessário multiplicar iniciativas semelhantes para alcançar metas nacionais de saneamento, especialmente nas áreas urbanas que continuam deficientes.

Estratégias para replicação e lições para profissionais do saneamento

Para que gestores e técnicos do setor de saneamento possam extrair lições práticas desse caso, destacam-se:

  • Avaliar com antecedência o perfil técnico e de risco dos municípios a serem atendidos, adaptando projeto de rede, estações elevatórias e estimativas de demanda.
  • Definir critérios de desempenho e indicadores (qualidade de efluente, disponibilidade, eficiência energética) que devem nortear contratos de saneamento.
  • Inserir cláusulas de governança e mecanismos de reajuste e repactuação para garantir equilíbrio econômico-financeiro num contrato de longa duração.
  • Implementar sistemas de monitoramento, automação e telemetria nas estações e redes, promovendo operação inteligente e preventiva.
  • Capacitar equipes locais: manutenção, operação e gestão comercial exigem pessoal treinado e compromisso contínuo.
  • Estudar modelos de arrecadação e tarifação compatíveis com a realidade social dos municípios, de modo que a tarifa não inviabilize o acesso ao serviço.

A replicação desse modelo em outras regiões depende de capacidade institucional e de atração de investidores com perfil técnico e sustentável.

Considerações finais

O contrato de saneamento firmado entre CESAN e ACCIONA para oito municípios do Espírito Santo configura um marco para o setor no Brasil: volume significativo de investimento (R$ 540 milhões), escopo técnico abrangente (4 ETEs, 65 estações elevatórias, 320 km de redes) e prazo de concessão de 23 anos.

Com foco em eficiência, sustentabilidade e governança, o projeto pode servir de referência para futuras parcerias em saneamento, especialmente nas regiões onde a cobertura ainda é insuficiente. Para operadores, técnicos e gestores do setor, o caso oferece aprendizado importante em concepção, implantação, operação e mitigação de riscos em concessões de saneamento.

Fontes