O setor de saneamento enfrenta um desafio constante: aumentar a sustentabilidade financeira enquanto expande cobertura e qualidade. Para isso, as companhias têm buscado diversificar suas fontes de receita, aproveitando infraestrutura existente, resíduos, dados e parcerias estratégicas. A seguir, são apresentadas 10 iniciativas concretas e lucrativas, com casos reais e dados técnicos de fácil compreensão, capazes de transformar o saneamento em um verdadeiro ecossistema de soluções urbanas e ambientais.
1. Energia renovável a partir do esgoto
A geração de energia por biogás é uma das formas mais eficazes de transformar passivos em lucro dentro do saneamento. A Sabesp, por exemplo, implantou sistemas de aproveitamento de biogás nas ETEs Barueri e Franca, gerando energia suficiente para abastecer cerca de 2.500 residências.
Esses sistemas capturam o metano produzido na digestão anaeróbia e o utilizam em motogeradores. O investimento médio é de R$ 8 milhões por planta, com retorno financeiro em aproximadamente 5 anos. Além de reduzir emissões de gases de efeito estufa, a energia excedente pode ser comercializada, criando uma nova linha de receita para as companhias de saneamento.
2. Produção e venda de biossólidos
O lodo tratado das estações de esgoto é outro ativo de grande potencial econômico. A Sanepar, no Paraná, opera um programa pioneiro de uso agrícola de biossólidos, distribuindo mais de 50 mil toneladas por ano para produtores rurais.
Com controle rigoroso de metais pesados e patógenos, o material é certificado e substitui fertilizantes químicos, gerando economia no campo e receita adicional para o saneamento. Cada tonelada de biossólido estabilizado pode render cerca de R$ 80, tornando-se uma fonte de faturamento contínua e ambientalmente sustentável.
3. Água de reuso industrial
O AcquaPolo, parceria entre a Sabesp e a GS Inima, é o maior projeto de reuso industrial da América Latina. Localizado no ABC Paulista, fornece 650 L/s de água de reuso para o Polo Petroquímico de Capuava.
O empreendimento utiliza processos de ultrafiltração e osmose reversa, assegurando qualidade para processos industriais exigentes. Além de preservar mananciais, o modelo gera contratos estáveis de longo prazo com retorno anual entre 6% e 10%. É um exemplo de saneamento inovador que alia sustentabilidade a rentabilidade.
4. Créditos de carbono e finanças verdes
A geração e comercialização de créditos de carbono tornou-se uma fonte crescente de receita para o saneamento. A Caesb, no Distrito Federal, certificou suas ETEs no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) da ONU, vendendo créditos correspondentes à redução de emissões de metano.
Cada tonelada de CO₂ equivalente pode render de US$ 8 a US$ 15 no mercado voluntário. Projetos de biogás, reuso e eficiência energética são elegíveis e atraem investidores de fundos ESG, fortalecendo o caixa e a imagem ambiental da companhia.
5. Gestão de drenagem urbana
A integração da drenagem urbana à estrutura do saneamento amplia receitas e melhora o controle de alagamentos. Em Maceió (AL), está sendo estruturada uma PPP de aproximadamente R$ 1,5 bilhão para operação, limpeza e manutenção de sistemas pluviais, com remuneração atrelada ao desempenho.
As companhias de saneamento possuem know-how técnico em hidráulica, GIS e modelagem, o que as torna candidatas ideais para esse tipo de contrato. A remuneração é baseada em indicadores de performance — como tempo de resposta e número de alagamentos evitados —, garantindo previsibilidade e retorno financeiro consistente.
6. Telemetria e gestão inteligente de consumo
A automação do consumo é um novo campo de receita para o saneamento. Companhias brasileiras, como a Corsan e a Copasa, vêm testando tecnologias IoT que monitoram em tempo real o consumo de grandes clientes, enviando alertas automáticos de vazamentos e relatórios analíticos mensais.
Os planos funcionam por assinatura, com cobrança média de R$ 20 por ponto monitorado. Além de melhorar a eficiência operacional, o sistema reduz perdas não faturadas e gera relacionamento de valor com clientes estratégicos, principalmente do setor industrial.
7. Locação de ativos e infraestrutura
Reservatórios, torres e terrenos pertencentes a companhias de saneamento podem gerar receitas por meio de locação para antenas de telecomunicações, painéis solares e pequenas centrais de dados.
A Copasa, em Minas Gerais, iniciou a locação de áreas para instalação de antenas 5G, alcançando rendimentos mensais de até R$ 5.000 por torre. Além disso, estruturas com cobertura ampla permitem parcerias para implantação de usinas solares, reduzindo custos operacionais e criando retorno financeiro recorrente sem interferir na operação.
8. Serviços laboratoriais e calibração
Muitas companhias de saneamento possuem laboratórios certificados que podem atender demandas externas. A Corsan, por exemplo, presta serviços de análises físico-químicas e microbiológicas para prefeituras e empresas privadas, cobrando por amostra e emitindo relatórios técnicos com rastreabilidade completa.
Essa estrutura, já existente, pode ser expandida para oferecer calibração de hidrômetros, ensaios de materiais hidráulicos e análises de efluentes industriais. É uma oportunidade de monetizar infraestrutura e expertise técnica sem necessidade de grandes investimentos.
9. Educação ambiental corporativa
Empresas privadas estão cada vez mais pressionadas a adotar metas de sustentabilidade e eficiência hídrica. O saneamento pode explorar essa tendência oferecendo cursos e programas de certificação ambiental.
A Sabesp desenvolveu programas de capacitação corporativa em parceria com universidades, ensinando práticas de uso racional da água e gestão de efluentes. Esses cursos podem ser cobrados de instituições e empresas, gerando receitas diretas e reforçando o papel educador do setor.
Um pacote de formação de 30 participantes pode gerar mais de R$ 15 mil, além de promover conscientização ambiental e engajamento social.
10. Monetização de dados e inteligência territorial
Com o avanço da transformação digital, o saneamento passou a gerar e armazenar grandes volumes de dados geográficos, hidráulicos e de consumo. Quando tratados e anonimizados, esses dados tornam-se ativos valiosos.
A Sanepar e a Sabesp já aplicam inteligência geográfica para planejar obras e prever falhas em redes. Esses dados também podem ser licenciados para prefeituras, seguradoras e construtoras interessadas em mapas de risco hídrico, consumo e vulnerabilidade urbana.
Esse modelo, conhecido como Data as a Service (DaaS), é uma das fronteiras mais promissoras para monetização, exigindo apenas governança de dados e conformidade com a LGPD.
Conclusão
O futuro do saneamento vai muito além da tarifa de água e esgoto. As companhias que se reinventam e exploram novas linhas de receita — como energia limpa, reuso, créditos de carbono e inteligência territorial — passam a operar de forma mais eficiente, rentável e sustentável.
Essas práticas não só fortalecem a saúde financeira do setor, mas também geram benefícios ambientais e sociais, transformando o saneamento em vetor de inovação e desenvolvimento urbano.
O caminho está aberto: basta combinar visão estratégica, capacidade técnica e vontade de inovar.
Fontes (com links clicáveis)
- Sabesp – Projeto de geração de biogás em ETE Barueri
- Sanepar – Uso agrícola de biossólidos
- GS Inima e Sabesp – Projeto AcquaPolo
- Caesb – Créditos de carbono em ETEs
- PPP de drenagem urbana de Maceió – Alagoas Ativos
- Copasa – Locação de áreas e antenas 5G
- Corsan – Serviços laboratoriais certificados
- Sabesp – Programas de educação ambiental
- Sanepar – Inteligência geográfica aplicada ao planejamento urbano



