São Paulo vive novamente dias de tensão no abastecimento de água. Desde o dia 1º de setembro de 2025, o Sistema Cantareira retornou à Faixa 3 – Alerta, algo que não acontecia desde dezembro de 2022, segundo a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). O fato de o maior manancial da Região Metropolitana de São Paulo, responsável direto pelo atendimento de quase nove milhões de pessoas, ter migrado de faixa é um indicador claro de que a estiagem prolongada e a baixa recarga dos reservatórios pressionam cada vez mais o sistema.
A decisão da ANA e dos órgãos gestores reduziu a captação permitida de 31 para 27 m³/s, forçando a Sabesp a adotar um plano emergencial de operação. A medida mais visível é a redução da pressão noturna em toda a Grande São Paulo, das 21h às 5h, estratégia que busca economizar cerca de 4 m³/s, aliviar perdas reais da rede e retardar a necessidade de rodízios oficiais. Além disso, a companhia passou a acionar de forma intensiva a interligação com o Paraíba do Sul, bombeando água do reservatório de Jaguari para reforçar o Cantareira e, assim, equilibrar a distribuição dentro do Sistema Integrado Metropolitano (SIM). Também estão em andamento manobras de transferência entre os demais mananciais, como Alto Tietê, Guarapiranga e Rio Grande, para dividir a carga de produção e reduzir a pressão sobre o Cantareira.
Os números confirmam a gravidade do momento. Em 2 de setembro, o volume total dos mananciais da Região Metropolitana de São Paulo estava em apenas 36,9%, o menor para a data desde 2015. O Cantareira operava em torno de 34% do volume útil, o Alto Tietê em 29% e o Guarapiranga em pouco mais de 53%. Embora a cidade não esteja diante de um colapso imediato, esses índices demonstram que a margem de segurança é limitada e dependente do regime de chuvas dos próximos meses.
Comparar a situação atual com a crise histórica de 2014–2015 ajuda a dimensionar riscos e avanços. Naquela época, o Cantareira chegou a operar abaixo de 10% de sua capacidade, exigindo o uso do chamado “volume morto” e submetendo a população a rodízios não oficiais. Hoje, a realidade é diferente em três aspectos cruciais: primeiro, São Paulo dispõe de obras estruturantes de resiliência hídrica, como a interligação do Paraíba do Sul, inexistente em 2015; segundo, há regras claras de operação (Resolução Conjunta ANA/DAEE nº 925/2017), que definem limites de retirada conforme a faixa de armazenamento, garantindo previsibilidade; terceiro, há gestão preventiva, com medidas adotadas antes de um colapso, diferente da demora que marcou a crise passada.
Isso não significa, contudo, que o quadro seja confortável. As análises hidrológicas do Cemaden projetam que, mesmo com chuvas dentro da média histórica, o Cantareira deverá permanecer em Faixa de Alerta até o fim de setembro e só apresentar recuperação parcial na estação chuvosa, entre novembro e março. Caso as precipitações fiquem abaixo da média, o risco de evoluir para a Faixa de Restrição ainda em 2025 é real.
Em resumo, a Região Metropolitana de São Paulo enfrenta uma crise de abastecimento que exige máxima atenção técnica. O retorno do Cantareira à Faixa de Alerta, a redução da captação para 27 m³/s, a queda da pressão noturna e o uso intensivo da interligação com o Paraíba do Sul mostram que as medidas emergenciais já estão em prática. Ainda não se trata do mesmo colapso de 2014–2015, mas a sinalização é clara: sem chuvas consistentes e disciplina operacional, a crise tende a piorar antes de melhorar.
Conheça todas as cinco faixas operativas do Sistema Cantareira, conforme as regras da Resolução Conjunta ANA/DAEE nº 925/2017. Isso é fundamental para entender como funciona o “semáforo” de operação desse que é o principal manancial de abastecimento da Região Metropolitana de São Paulo. Cada faixa determina:
- O quanto a Sabesp pode retirar para abastecer a RMSP;
- O quanto precisa ser liberado para os rios das bacias PCJ (Piracicaba, Capivari e Jundiaí);
- O nível de criticidade e de medidas de gestão que devem ser adotadas.
A lógica é simples: quanto menor o volume armazenado, menor a retirada autorizada, garantindo que o sistema não colapse antes da chegada do período chuvoso.
Faixa 1 – Normalidade
- Armazenamento: Acima de 40% do volume útil.
- Retirada autorizada: Até 31 m³/s para a RMSP (capacidade plena outorgada).
- Defluências para PCJ: Normais, sem restrição adicional.
- Significado: Situação considerada estável. O sistema opera sem restrições, atendendo plenamente a RMSP e garantindo vazões mínimas a jusante.
Faixa 2 – Atenção
- Armazenamento: Entre 30% e 40% do volume útil.
- Retirada autorizada: Mantém 31 m³/s, mas exige maior vigilância sobre os níveis.
- Defluências para PCJ: Podem ser ajustadas de acordo com as condições hidrológicas.
- Significado: O sistema entra em estado de atenção preventiva. A gestão já deve começar a avaliar medidas de contenção, embora não haja redução imediata da retirada máxima.
Faixa 3 – Alerta
- Armazenamento: Entre 20% e 30% (algumas versões normativas definem entre 20%–30% ou 20%–40%, mas o consenso é que abaixo de 30% entra no Alerta).
- Retirada autorizada: Reduzida para 27 m³/s.
- Defluências para PCJ: Sofrem cortes proporcionais para preservar reservas.
- Significado: É o sinal amarelo forte. O sistema já opera sob restrição de retirada, com medidas ativas de contingência (como redução de pressão, manobras entre sistemas e uso de interligações).
Faixa 4 – Restrição
- Armazenamento: Entre 10% e 20% do volume útil.
- Retirada autorizada: Limitada a 23 m³/s.
- Defluências para PCJ: Severamente reduzidas.
- Significado: O sinal vermelho da operação. O sistema está próximo do limite de segurança e pode exigir rodízio oficial de abastecimento. É o estágio imediatamente anterior ao uso do chamado “volume morto”.
Faixa 5 – Especial
- Armazenamento: Abaixo de 10% do volume útil.
- Retirada autorizada: Fica ainda mais restrita e depende de autorização emergencial da ANA/DAEE.
- Defluências para PCJ: Mínimas possíveis, para manter apenas a sobrevivência ecológica dos rios.
- Significado: É o cenário crítico absoluto, que remete diretamente à crise de 2014–2015, quando foi necessário bombear água do volume morto. A gestão passa a ser de sobrevivência do sistema, e medidas drásticas são inevitáveis.
Hoje, o Cantareira está em torno de 34%, ou seja, dentro da Faixa 3 – Alerta. Isso significa que a Sabesp já opera com retirada reduzida e medidas preventivas, e que há risco real de descer para a Faixa de Restrição caso as chuvas não cheguem com força nas próximas semanas.



