Saneamento em Manaus: inovação nas áreas vulneráveis

Em uma metrópole com geografia desafiadora como Manaus, a implantação de sistemas de saneamento vai além da infraestrutura convencional. A expansão dos serviços de água e esgoto na capital do Amazonas demonstra como o saneamento técnico adequado às condições locais pode reduzir desigualdades, melhorar a saúde pública e reforçar a dignidade de comunidades periféricas. Ao tratar de redes elevadas sobre palafitas e tubulações ancoradas na beira de igarapés, o setor de saneamento prova que a solução técnica e social pode caminhar lado a lado.

1. O contexto desafiador do saneamento na capital amazônica

A realidade da capital amazonense traduz um grande desafio para o setor de saneamento. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes ao Censo 2022, cerca de 53,9% da população de Manaus reside em regiões vulneráveis. Nessas áreas, moradias em palafitas — construções elevadas sobre estacas — e em rip-raps (solo instável à beira de igarapés) exigem sistemas de saneamento adaptados.

Além disso, a expansão urbana desordenada e a presença de vias tortuosas ou beiras-de-rio dificultam a implantação de redes convencionais de água e esgoto. Nesse contexto, a concepção de soluções de saneamento precisa considerar a topografia, o ciclo das cheias, o nível dos igarapés e a necessidade de acessibilidade das equipes de manutenção.

2. Soluções inovadoras de saneamento implantadas

Rede aérea de água em palafitas

Nas casas elevadas acima do nível dos igarapés, a tubulação convencional era facilmente arrastada pelas cheias. Para solucionar este problema, foi implantada a rede aérea de água, na qual tubos são fixados nas passarelas das moradias e hidrômetros são suspensos. Assim, quando o nível da água sobe, a estrutura continua funcionando de forma segura.

Tubulação ancorada para coleta de esgoto

No caso da coleta de esgoto, adotou-se o sistema de gravidade para condução até a estação de tratamento. Entretanto, nas áreas alagáveis, os tubos foram fixados em estacas de concreto armado à margem dos igarapés, garantindo segurança mesmo em períodos de cheia.

Microbacias como estratégia operacional

O programa “Trata Bem Manaus” dividiu o município em microbacias independentes de coleta e tratamento de esgoto. Essa estratégia permite que estações menores operem de forma mais rápida e adequada ao ambiente local.

3. Impactos para o saneamento, saúde e ambiente

Os resultados das intervenções no saneamento já são observados em diversas áreas. Ambientalmente, houve uma expressiva redução da poluição de corpos hídricos, como no igarapé do Beco do Nonato, onde a DBO caiu de 68 mg/L para 22,8 mg/L após a implantação da coleta de esgoto.

Do ponto de vista de saúde pública — sempre diretamente ligado ao saneamento — a incidência de hepatite A caiu 88% entre 2018 e 2024, conforme dados da Fundação de Vigilância em Saúde.

Além disso, o saneamento atua como vetor social. Nas comunidades de palafitas, a implantação dos serviços permitiu a emissão de faturas com endereço formal, auxiliando famílias no acesso ao sistema bancário e de crédito.

  • Maior confiabilidade dos serviços
  • Redução de perdas
  • Manutenção preventiva reduzida
  • Maior aderência ao uso adequado do sistema

4. Aspectos técnicos para profissionais de saneamento

a) Adaptação à topografia e ao ciclo hídrico

Em áreas de cheias ou ocupações ribeirinhas, a solução técnica não pode assumir tubulações enterradas. A rede aérea e a tubulação ancorada garantem funcionamento contínuo e seguro. Isso requer planejamento que considere variações de nível, pressões hidrostáticas e estruturas elevadas.

b) Modelagem por microbacias

A divisão por microbacias reduz o tempo de construção, facilita o monitoramento e permite modular o sistema de coleta e tratamento. Esse modelo distribuído aumenta a flexibilidade operacional.

c) Engajamento social

O mapeamento das moradias, o diálogo com líderes comunitários e a coleta de dados precisos foram essenciais para reduzir ligações clandestinas e facilitar operações de manutenção.

d) Indicadores de desempenho

A queda da DBO e a redução de doenças são métricas fundamentais para medir a eficácia das intervenções. Profissionais devem monitorar indicadores como:

  • Volume de água tratada
  • Percentual de coleta de esgoto
  • Redução de doenças de veiculação hídrica
  • Qualidade dos corpos hídricos

e) Financiamento e subsídios

No saneamento, o acesso universal exige políticas tarifárias inclusivas. Em Manaus, programas sociais específicos, como tarifas reduzidas, fortalecem a inclusão em famílias vulneráveis.

5. Relevância para o saneamento no Brasil e perspectivas

A atuação em Manaus está alinhada ao Novo Marco Legal do Saneamento (Lei 14.026/2020), que define metas de universalização até 2033. O caso de Manaus representa um aprendizado valioso para companhias que trabalham em contextos geográficos complexos ou com forte vulnerabilidade social.

  • Soluções adaptadas ao contexto local
  • Sistemas distribuídos e moduláveis
  • Importância da participação social
  • Monitoramento contínuo de indicadores
  • Modelos tarifários inclusivos

Manaus se consolida como um case relevante para o setor, mostrando que engenharia, diálogo comunitário e políticas públicas alinhadas podem transformar a qualidade de vida de populações inteiras.

6. Desafios ainda pendentes no saneamento

Apesar dos avanços, ainda existem desafios a serem superados:

  • A universalização da coleta e tratamento ainda está em andamento
  • Áreas muito instáveis exigem soluções mais complexas
  • A manutenção em áreas de risco exige planejamento contínuo
  • A integração entre concessionária, município e reguladores é essencial

Esses desafios reforçam que o saneamento exige gestão adaptativa, análises constantes e compromisso de longo prazo.

7. Conclusão

O saneamento em Manaus mostra que engenharia diferenciada, planejamento social e políticas tarifárias inclusivas podem gerar resultados concretos. Para profissionais do setor, a experiência da capital amazonense evidencia que superar barreiras geográficas e sociais exige estratégia, adaptação e inovação técnica. Ao integrar redes aéreas, tubulações ancoradas e microbacias, o saneamento para áreas vulneráveis transforma saúde, ambiente e dignidade.

Fontes